O PT de Porto Alegre, passa por um conflito que não só relfete a situação prévia às eleições municipais, e as teses de candidatura própria, ou frentões, contemplando alianças pragmáticas, com partidos da base aliada do Governo Federal, mas do partido como um todo.
Os dilemas criados com a eleição de Lula, em 2002, e os rumos tomados pelo seu Governo, abrindo espaços para legendas e entes, totalmente avessos à práxis do Partido dos Trabalhadores. Um Governo de coalizão, definido por alguns como de centro-esquerda, adotando uma política econômica de direita, e programas sociais-democratas, visando a redução da miséria e a inclusão de brasileiros "sem chance", ao universo do consumo.
O Partido ficou entre a defesa incondicional do governo, transformando-se, praticamente em correia de transmissão desse, internalizando metas do governo em seus programas e estatutos internos, e a manutenção de seu status de "Partido das Massas", ligado aos movimentos sociais.
Paralelo a isso, alguns projetos municipais, como em Belo Horizonte, Fortaleza e outras capitais, ficaram condicionados aos interesses da base aliada federal.
Agora, chega a vez de Porto Alegre.
A cidade foi a primeira grande conquista do PT, administrada por 16 anos, ininterruptos pelo Partido, vista por muitos, como uma capital protegida da devastadora onda liberal dos anos 90, de transporte público de qualidade, estatais ainda estatais e um modelo de democracia participativa, que se tornou referência mundial.
Porto Alegre, agora, tenta evitar o fim da democracia interna do Partido, de suas decisões tomadas pela base e a formação de grupos de decisão nacional, a exemplo partidos de direita e seus núcleos de poder, que tomam decisões unilaterais, sem consulta às bases, definindo os cenários de disputa em todas as esferas.
A aceitação de uma "nacionalização" dessa decisão, fará do PT, um PSDB, em termos de instâncias decisórias, com um "triunvirato" ou outro formato de "caciquia", decidindo tudo, levando o partido à reboque.
A realização de prévias, ou mesmo lançamento de candidatura de consenso, é condição básica para a sobrevivência do Partido, como o conhecemos: plural, democrático, de bases, militante.
O texto abaixo, extraído do Blog RS Urgente, de Marco aurélio Weissheimer, analisa o tema de forma mais aprofundada, comparando os "descaminhos" petistas aos tomados pelo "velho MDB", que acabaram por transformar o partido em um ente fisiológico, apenas figurando em cargos administrativos, independentemente da linha do governo:
PT corre o risco de seguir o rumo do “velho MDB”?
Ao não ter candidatura própria em cidades como Porto Alegre, o PT corre o risco de reeditar na capital gaúcha o que aconteceu com o partido em capitais como Belo Horizonte e Rio de Janeiro, onde uma sequência de alianças discutíveis acabou por enfraquecer enormemente o partido. A avaliação é de Raul Pont, deputado estadual e presidente do PT no Rio Grande do Sul, que vem defendendo com maior ênfase nas últimas semanas a necessidade de o partido ter candidatura própria em Porto Alegre nas eleições de 2012. Em uma plenária municipal realizada quarta-feira à noite na capital, a Democracia Socialista (DS), tendência de Pont, reafirmou essa posição.
“Precisamos dessa orientação para trazer a Porto Alegre, novamente, uma experiência rica, coletiva e plural de uma cidadania ativa, consciente e radicalmente democrática”, afirmou o ex-prefeito da capital, que defendeu ainda a necessidade de construir um nome de consenso dentro do partido e evitar a realização de prévias. Pont colocou seu nome à disposição do partido para concorrer no próximo ano. Quem também já manifestou disposição em disputar a indicação do PT é o presidente municipal do partido o vereador Adeli Sell. Essa semana, a ministra da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Maria do Rosário, que concorreu à prefeitura na eleição de 2008, também defendeu a tese da candidatura própria, citando os nomes dos deputados estaduais Raul Pont e Adão Villaverde, do deputado federal Henrique Fontana e do vereador Adeli Sell como possíveis candidatos. Afirmou ainda que seu nome está sempre à disposição do partido e que as negociações devem passar também por uma conversa com a presidenta Dilma Rousseff. Outro nome, sempre lembrado, é o do ex-governador Olívio Dutra.
Mas a tese da candidatura própria em Porto Alegre não está consolidada. Pelo contrário, tem fortes adversários, a começar pela direção nacional do PT que defende a nacionalização da eleição municipal. Isso implicaria, entre outras coisas, abrir mão da candidatura própria para apoiar candidaturas de partidos da base do governo. Em Porto Alegre, dois nomes se enquadrariam neste critério: a deputada federal Manuela D’Ávila, do PCdoB, e o atual prefeito José Fortunati, do PDT. Considerada uma hipótese pouco provável, o apoio a Fortunati ganhou força nos últimos dias com a movimentação dos presidentes nacionais do PT e do PDT, Rui Falcão e Carlos Lupi, respectivamente. Um aliança com o PDT em Porto Alegre implicaria desde já uma significativa mudança no secretariado de Fortunati, com o afastamento de integrantes do PMDB e PSDB. Envolveria também uma aliança mais ampla em outras cidades do Estado, o que, em tese, poderia interessar ao governador Tarso Genro que, até agora, não se manifestou abertamente sobre o tema.
No entanto, a escolha com Fortunati poderia abrir uma crise com um dos parceiros mais tradicionais do PT, o PCdoB. Afinal, se o critério é abrir espaço para aliados do governo federal, por que Fortunati e não Manuela?
Raul Pont acredita que esse impasse pode gerar o efeito contrário ao desejado pela política de alianças defendida pela direção nacional do partido: ao invés de fortalecer alianças pode abrir fissuras indesejáveis. Mais uma razão para apoiar a tese da candidatura própria, diz Pont, firmando um pacto de não agressão com os aliados e apontando para uma aliança no segundo turno, caso ocorra.
Mas, para além do xadrez da realpolitik, a eleição em Porto Alegre tem um ingrediente político que está relacionado ao futuro do PT em nível nacional. A advertência feita pelo deputado Raul Pont sobre o risco do enfraquecimento do partido nas principais capitais é compartilhada por muitos outros dirigentes e militantes petistas. Há quem lembre o caminho adotado pelo PMDB que, em um determinado momento, passou a privilegiar toda sorte de alianças em nível nacional seguindo uma lógica absolutamente pragmática. Uma das razões pelas quais o PT cresceu e se tornou um partido de dimensões nacionais foi justamente a disputa de eleições majoritárias com candidaturas próprias.
A realidade agora é outra, dizem os defensores da tese da nacionalização da eleição municipal. Pode ser, mas a lógica escolhida para se mover nessa nova realidade é antiga e já mostrou que, se no curto prazo, pode trazer alguns ganhos, no médio e no longo prazo podem descaracterizar programaticamente um partido de modo irreversível. No caso do PT, dirigentes de hoje podem correr o risco de estar repetindo, em alguns anos, o discurso nostálgico do senador Pedro Simon que lamenta o fim do “velho MDB”.
A disputa eleitoral em Porto Alegre tem uma outra dimensão ainda, de caráter mais amplo. Inspiração e berço do Fórum Social Mundial, a cidade tornou-se uma referência para a esquerda mundial. A chama que animou essa inspiração respira por aparelhos hoje. A perspectiva do retorno do FSM em 2013 e a realização, no início de 2012, de um grande fórum temático preparatório a Rio+20, reabre, contudo, a possibilidade de a cidade voltar a sediar grandes debates sobre o futuro da humanidade. O momento, aliás, é muito propício, considerando o agravamento da crise econômica nos países mais ricos do mundo e a crescente militarização da agenda política das nações. É claro que essas considerações costumam passar longe das planilhas dos magos do carteado eleitoral. Mas elas têm o mau hábito de acabar influenciando a realidade. Seja como for, se o cenário ficar extremamente complexo, os dilemas enfrentados pelo PT em Porto Alegre e em outras cidades podem ser resolvidos à maneira antiga: ouvindo a militância!
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