sábado, 1 de setembro de 2012

Porto Alegre comandada por quem?

Fortunati entrega o comando da cidade, "de forma definitiva",

a Jesus Cristo | Foto: Ricardo Giusti/PMPA
Uma comunista, que evidentemente esqueceu-se de Karl Marx*, ajoelha-se e cria comitê Gospel em Porto Alegre, acompanhada pelos demais candidatos que em nome do voto, esquecem que a prefeitura é o Estado, e o Estado é laico.
Não há como participar de encontros LGBT e no dia seguinte, de reuniões com evangélicos, comprometendo-se com políticas contraditórias com ambos.
A coerência cai na esteira eleitoreira.

O texto abaixo foi extraído do site do jornal eletrônico Sul 21:


Em Porto Alegre, principais candidatos buscam aproximação com eleitorado religioso

Rachel Duarte
Os candidatos que lideram as pesquisas para a Prefeitura de Porto Alegre estão marcando compromissos com a finalidade de se  aproximarem dos eleitores religiosos. Manuela D´Ávila (PCdoB) e Adão Villaverde (PT) têm participado de atos organizados por partidos cristãos que integram suas coligações. Já o prefeito José Fortunati (PDT) e o professor Wambert Di Lorenzo (PSDB), aceitam convites para eventos em igrejas católicas. Os representantes da esquerda mais radical, Érico Correa (PSTU) e Roberto Robaina (PSOL) optam por não misturar religião com política e condenam a postura dos adversários. Nesta sexta-feira (31), o PSTU exibirá programa eleitoral em defesa da descriminalização do aborto. O programa vai ao ar menos de uma semana após inauguração do Comitê Gospel da comunista Manuela D´Ávila.
Manuela D´Ávila discursa para lideranças evangélicas em lançamento de comitê Gospel./ Foto: Tomás Edson.
A inauguração do comitê Gospel de Manuela ocorreu no último final de semana, na presença de representantes de igrejas evangélicas, comandados pelo presidente do Partido Social Cristão (PSC), Getúlio Vargas. Segundo a candidata, o espaço é mais um gesto de aproximação dos diferentes grupos de militantes que apoiam sua candidatura. “Lançamos diversos comitês. É um momento de encontro com o militante. Foi para representar a inclusão social. É bem diferente de assinar cartas, como outras candidaturas fizeram”, disse provocando o petista Adão Villaverde.
Villaverde lançou uma carta compromisso com os portoalegrenses com um tópico sobre religiosidade. No texto, defende os territórios das comunidades tradicionais de matriz africana e se compromete em incluir estas áreas no plano diretor da cidade. Já nas ações práticas, compareceu no mesmo final de semana em agendas da Assembleia de Deus e dos movimentos sociais LGBT.
“As nossas relações com as inúmeras denominações e motivações religiosas vêm de longa data. Historicamente o PT tem relações com a igreja católica e evangélica. Mas, temos uma compreensão ecumênica de respeito a todas as convicções. Em todos os governos de que participamos fomos defensores da liberdade de culto. As matizes religiosas tem por essência a inclusão social, fazem trabalhos de amparo e acolhimento, também desenvolvemos políticas públicas neste sentido”, disse o coordenador da campanha petista Gerson Almeida.
Manuela, por sua vez, também fez um gesto para a comunidade LGBT, vítima do conservadorismo religioso, três dias depois de lançar o comitê Gospel. “Lançamos o Comitê LGBT no dia 28 de agosto porque é o Dia da Visibilidade Lésbica. Foi a única ação pensada”, explicou.
“Uso a frase ‘Deus nos abençoe’ nos discursos por convicção”, afirma Fortunati
Já José Fortunati e Wambert Di Lorenzo aceitam convites de igrejas católicas por convicção. “Sou católico e tenho afinidades com muitas teses sociais da igreja. Mas não posso instrumentalizar a igreja. Sigo apenas minhas convicções que estão na minha consciência moral”, explica Wambert.
O tucano visitou a rádio gospel Nova Aliança logo no primeiro final de semana como candidato. Neste sábado (01/09), ele participa de evento numa igreja católica da periferia de Porto Alegre. Ele defende que, enquanto os grupos religiosos quiserem o ouvir, ele irá se apresentar. “Sou candidato. Não sou um cristão político e o estado é laico. Jamais me servirei disso para pedir voto”, afirma.
fortunati pastores
Fortunati entrega o comando da cidade, "de forma definitiva", a Jesus Cristo | Foto: Ricardo Giusti/PMPA
Outro candidato que cumpre compromissos com pastores e cristãos é o prefeito de Porto Alegre, José Fortunati (PDT). No dia 26 de agosto ele participou de evento na Igreja Encontros de Fé, ao lado do pastor Isaias Figueiró. Em setembro de 2011, durante a Marcha de Jesus, Fortunati chegou a dizer que “Jesus está no comando da capital”. Em todos os discursos, seja como prefeito ou como candidato, ele encerra dizendo “Que Deus nos abençoe”.
“Eu encerro todas as minhas falas com a frase ‘Que Deus nos abençoe’ porque não perdi minhas convicções só porque sou candidato. Mas eu respeito a diversidade religiosa. Na nossa gestão criamos um grupo de Diálogo Inter-religioso, para acolher todos os credos. Como prefeito, aceitei e aceito todos os convites de qualquer comunidade religiosa. Mantenho a mesma postura, por isso tenho algumas agendas de campanha neste sentido”, explicou.
Fortunati fez questão de dizer que não tirou fotos ao lado das lideranças religiosas, para não misturar o candidato e a fé. E, respondendo a crítica do presidente do Partido Social Cristão (PSC), Getúlio Vargas, aliado à Manuela D´Ávila (PCdoB),  o prefeito disse que não há burocracia nos alvarás das igrejas evangélicas. “Liberamos conforme os critérios da lei. Não importa qual o estabelecimento, se não estiver com o devido isolamento acústico, não liberamos. Não é porque é uma igreja que terá privilégios, a lei é para todos”, defendeu.
Estado Laico e Aborto
Os candidatos Erico Correa e Roberto Robaina adotam postura neutra. “Não participei e nem vou de qualquer ato religioso. O estado é laico. Utilizar estas agendas é uma política manipuladora e um desrespeito com a própria religiosidade”, argumenta o representante do PSOL.
Para Erico Correa (PSTU), a religião na eleição municipal faz parte do ‘vale-tudo’ pelo voto. “Todos defendem no discurso o estado laico. Mas o voto religioso não é laico. Tem comunista indo à missa, candidatos tomando café com bispos e jantando com os homossexuais. Nossa candidatura vai denunciar o retrocesso do conservadorismo, que já trouxe perdas na esfera nacional quando a Dilma (Rousseff) assinou a Carta ao Povo de Deus e inviabilizou o Kit Gay”, defende.
O PSTU estreia um programa eleitoral nesta sexta-feira (31) defendendo os direitos reprodutivos da mulher e abrindo o debate sobre o aborto na eleição. Como se trata de um tema nacional, os adversários não imaginam que a disputa municipal sofrerá a mesma influência da eleição presidencial de 2010, onde a moral pautou os debates.
Adão Villaverde discursa na Igreja Assembleia de Deus./ Foto: Luiz Avila
“Isto não é da alçada do prefeito. Mas, o PT assume que sempre foi favorável aos direitos das mulheres e a autonomia das mulheres sobre seus corpos. Defendemos isso sem desrespeitar as religiões. Inclusive temos uma proposta de criar um comitê inter-religioso junto ao gabinete do prefeito”, fala o petista Gerson Almeida.
Manuela D´Ávila diz que mantém as convicções que a fizeram presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal e defendeu estar disposta a resolver possíveis futuros impasses entre a base aliada sobre as políticas públicas de gênero. “O aborto não é tema municipal. Não irei utilizar minha campanha para responder à nenhuma candidatura sobre isso. Minha preocupação é com um SUS humanizado. E o meu programa de governo é aceito pelos partidos coligados. Se algo mudar, resolveremos as tensões. Toda gestão tem tensão”, fala.
“Usar religião na política é oportunismo”, reprova sociólogo
Mesmo se não render embates ideológicos, a fé poderá acabar rendendo votos de fieis simpatizantes dos candidatos nas urnas. Estratégia reprovada pelo sociólogo e professor de Teoria e Comportamento da Política Clássica da Ulbra, Ottomar Peske. “Isto é oportunismo. A boa fé não permite expedientes ao lado de religiosos ou atos políticos com religiões. Isso trabalha com mensagem no campo da subjetividade, é má fé”, avalia.
Wambert Di Lorenzo (PSDB) disse que tem afinidades com as teses sociais da igreja católica./Foto: Divulgação
Sociólogo luterano, Peske separa o campo do humano e terreno, do campo das discussões sobre fé. “Eu tenho as minhas convicções, porém, quando vou discutir política ou qualquer outra ciência, tento não misturar estas questões. Como dizia Kant: a fé inicia onde a razão termina”, salienta. Para o professor, utilizar a ética da religião serve para a política, o que legitimaria padres ou bispos se candidatarem. “Agora a ética da política não pode ser misturada à religião. Quem legisla ou governa tem que governar para todos, índios, judeus, cristãos. Misturar isso é apelo de marketing. Como fez Collor ao se apresentar utilizando a imagem de Deus. Ele pegou a fama de iluminado, recebendo a benção de Frei Damião e colocando a mãe na TV orando por proteção ao filho. É a tática do vale-tudo”, define.
Até o fechamento desta matéria o candidato Jocelin Azambuja (PSL) não foi localizado para falar sobre o tema. E, também convidado a falar sobre o assunto, o candidato Adão Villaverde foi representado pelo coordenador da campanha petista Gerson Almeida.
* Notas do blogueiro: Escreveu Karl Marx, no livro Crítica da Filosofia do Direito de Hegel:


"É este o fundamento da crítica irreligiosa: o homem faz a religião, a religião não faz o homem. E a religião é de fato a autoconsciência e o sentimento de si do homem, que ou não se encontrou ainda ou voltou a se perder. Mas o Homem não é um ser abstrato, acocorado fora do mundo. O homem é o mundo do homem, o Estado, a sociedade. Este Estado e esta sociedade produzem a religião, uma consciência invertida do mundo, porque eles são um mundo invertido. A religião é a teoria geral deste mundo, o seu resumo enciclopédico, a sua lógica em forma popular, o seu point d'honneur espiritualista, o seu entusiasmo, a sua sanção moral, o seu complemento solene, a sua base geral de consolação e de justificação. É a realização fantástica da essência humana, porque a essência humana não possui verdadeira realidade. Por conseguinte, a luta contra a religião é, indiretamente, a luta contra aquele mundo cujo aroma espiritual é a religião.
A miséria religiosa constitui ao mesmo tempo a expressão da miséria real e o protesto contra a miséria real. A religião é o suspiro da criatura oprimida, o ânimo de um mundo sem coração e a alma de situações sem alma. A religião é o ópio do povo.
A abolição da religião enquanto felicidade ilusória dos homens é a exigência da sua felicidade real. O apelo para que abandonem as ilusões a respeito da sua condição é o apelo para abandonarem uma condição que precisa de ilusões. A crítica da religião é, pois, o germe da crítica do vale de lágrimas, do qual a religião é a auréola.
A crítica arrancou as flores imaginárias dos grilhões, não para que o homem os suporte sem fantasias ou consolo, mas para que lance fora os grilhões e a flor viva brote. A crítica da religião liberta o homem da ilusão, de modo que pense, atue e configure a sua realidade como homem que perdeu as ilusões e reconquistou a razão, a fim de que ele gire em torno de si mesmo e, assim, em volta do seu verdadeiro sol. A religião é apenas o sol ilusório que gira em volta do homem enquanto ele não circula em tomo de si mesmo.
Consequentemente, a tarefa da história, depois que o outro mundo da verdade se desvaneceu, é estabelecer a verdade deste mundo. A tarefa imediatada da filosofia, que está a serviço da história, é desmascarar a auto-alienação humana nas suas formas não sagradas, agora que ela foi desmascarada na sua forma sagrada. A crítica do céu transforma-se deste modo em crítica da terra, a crítica da religião em crítica do direito, e a crítica da teologia em crítica da política."

Alguns comunistas esqueceram de Marx.
O sociólogo Luterano equivoca-se ao afirmar que a "Ética da religião serve para a política", apenas defendendo sua categoria, deixando de lado o fato de que a ética e a moral necessárias para o político são republicanas e laicas, sob risco de repressão, perseguição e mesmo o favorecimento de grupos religiosos em detrimento de outros.
Um estado para todos está além da ética religiosa. Está alicerçada na busca de soluções para os problemas reais da sociedade, deixando os imaginários para outro campo, longe do Estado.

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