sexta-feira, 11 de setembro de 2009

11 de Setembro

Em 1973, morte de Salvador Allende marca o início da ditadura militar no Chile
Em um determinado momento da prolongada visita de 24 dias que o líder cubano Fidel Castro fez ao Chile de Salvador Allende, em novembro de 1971, veio à tona a questão militar. O presidente chileno ponderou que naquele país as Forças Armadas eram tradicionalmente neutras, não se intrometiam em política, ou seja, eram estritamente profissionais. Fidel retrucou que essa postura iria ser sustentada até o dia em que os interesses da classe a qual a hierarquia militar pertence fossem tocados. “Nesse dia, tomarão posição, e será contra você”.
Salvador Allende (foto) perdeu por três vezes as eleições presidenciais, em 1952, 1958 e 1964, antes de se eleger presidente do Chile, em 1970, como candidato de uma coligação de esquerda, a Unidade Popular. Entrou para a história como o primeiro marxista a chegar ao poder pelas urnas.
Allende assumiu a presidência no dia 3 de novembro de 1970 e durante seu governo nacionalizou as minas de cobre, a principal riqueza do país. Além disso, transferiu o controle das minas de carvão e dos serviços de telefonia para o Estado, aumentou a intervenção nos bancos e fez a reforma agrária, desapropriando grandes extensões de terras improdutivas e entregando-as aos camponeses.
Entretanto, os pilares socialistas no Chile não se firmaram como queria Allende. Os Estados Unidos, envolvidos na Guerra do Vietnã, não admitiam a instauração de um segundo regime socialista em sua área de influência. As nacionalizações e estatizações adotadas pela Unidade Popular também não eram bem vistas pelas grandes corporações norte-americanas.
Além disso, fatos graves começaram a acontecer, a exemplo do assassinato do Comandante em Chefe René Schneider, substituído pelo não menos constitucionalista general Carlos Prats.
Outra dificuldade foi o fato de o governo norte-americano submeter o Chile a um bloqueio econômico informal, que impedia o país de obter empréstimos internacionais ou bons preços para o cobre, principal produto de exportação. Allende acreditava que o objetivo da medida era sufocar a economia chilena até que um levante das Forças Armadas colocasse fim a "via chilena para ao socialismo".
Para agravar a situação, em setembro de 1972 iniciou-se uma greve de caminhoneiros financiada pela CIA e comandada por Leon Vilarín, um dos líderes do grupo paramilitar neofacista Patria y Libertad. A paralisação impediu o plantio da safra agrícola no país até 1973. Com o apoio dos industriais chilenos, a estratégia era provocar o desabastecimento de artigos de primeira necessidade no Chile.
A partir daí, o clima de tensão foi ficando cada vez mais intenso, com o Movimento da Esquerda Revolucionária (MIR) de um lado e o direitista Patria y Libertad de outro.
No dia 29 de junho de 1973 houve então a primeira tentativa de golpe, por meio de uma aliança entre o Patria y Libertad e os militares chilenos que pretendia tomar o Palácio de La Moneda, numa operação conhecida como El Tanquetazo.
Entretanto, a ação fracassou ao ser descoberta pela inteligência do Exército, então comandado por Prats.
Com isso, o general chegou a pedir a instauração do estado de sítio no país. A solicitação foi acatada por Allende, mas negada pelo Congresso.
Assim, a tomada do poder ficava cada vez mais iminente. O general Prats, que se recusava a participar do golpe militar, renunciou depois de uma manifestação de esposas de oficiais golpistas diante de sua residência.
Foi então que Salvador Allende nomeou um antigo militar que acreditava ser de total confiança: Augusto Pinochet.
Na madrugada de 11 de setembro de 1973, aviões militares sobrevoaram e bombardearam o palácio presidencial. Lá estava Allende, quase só. Não se dispondo a sofrer humilhações, valeu-se da submetralhadora que lhe fora presenteada por Fidel Castro para pôr fim à própria existência. Estava instaurada a sanguinária ditadura pinochetista.
Lembrança
Hoje, 36 anos depois, milhares de chilenos saíram às ruas de Santiago para lembrar a morte de Salvador Allende e o início da ditadura militar, que durou até 1990 e deixou mais de 3 mil mortos.
Texto extraído do blog do Júlio Garcia.
Abaixo reprodução do último discurso proferido pelo Presidente Salvador Allende, já cercado pelos golpistas, no palácio presidencial:
"Seguramente, esta será a última oportunidade em que poderei dirigir-me a vocês. A Força Aérea bombardeou as antenas da Rádio Magallanes. Minhas palavras não têm amargura, mas decepção. Que sejam elas um castigo moral para quem traiu seu juramento: soldados do Chile, comandantes-em-chefe titulares, o almirante Merino, que se autodesignou comandante da Armada, e o senhor Mendoza, general rastejante que ainda ontem manifestara sua fidelidade e lealdade ao Governo, e que também se autodenominou diretor geral dos carabineros.
Diante destes fatos só me cabe dizer aos trabalhadores: Não vou renunciar! Colocado numa encruzilhada histórica, pagarei com minha vida a lealdade ao povo. E lhes digo que tenho a certeza de que a semente que entregamos à consciência digna de milhares e milhares de chilenos, não poderá ser ceifada definitivamente. [Eles] têm a força, poderão nos avassalar, mas não se detém os processos sociais nem com o crime nem com a força. A história é nossa e a fazem os povos.
Trabalhadores de minha Pátria: quero agradecer-lhes a lealdade que sempre tiveram, a confiança que depositaram em um homem que foi apenas intérprete de grandes anseios de justiça, que empenhou sua palavra em que respeitaria a Constituição e a lei, e assim o fez.
Neste momento definitivo, o último em que eu poderei dirigir-me a vocês, quero que aproveitem a lição: o capital estrangeiro, o imperialismo, unidos à reação criaram o clima para que as Forças Armadas rompessem sua tradição, que lhes ensinara o general Schneider e reafirmara o comandante Araya, vítimas do mesmo setor social que hoje estará esperando com as mãos livres, reconquistar o poder para seguir defendendo seus lucros e seus privilégios.
Dirijo-me a vocês, sobretudo à mulher simples de nossa terra, à camponesa que nos acreditou, à mãe que soube de nossa preocupação com as crianças. Dirijo-me aos profissionais da Pátria, aos profissionais patriotas que continuaram trabalhando contra a sedição auspiciada pelas associações profissionais, associações classistas que também defenderam os lucros de uma sociedade capitalista. Dirijo-me à juventude, àqueles que cantaram e deram sua alegria e seu espírito de luta. Dirijo-me ao homem do Chile, ao operário, ao camponês, ao intelectual, àqueles que serão perseguidos, porque em nosso país o fascismo está há tempos presente; nos atentados terroristas, explodindo as pontes, cortando as vias férreas, destruindo os oleodutos e os gasodutos, frente ao silêncio daqueles que tinham a obrigação de agir. Estavam comprometidos.
A historia os julgará.
Seguramente a Rádio Magallanes será calada e o metal tranqüilo de minha voz não chegará mais a vocês. Não importa. Vocês continuarão a ouvi-la. Sempre estarei junto a vocês. Pelo menos minha lembrança será a de um homem digno que foi leal à Pátria. O povo deve defender-se, mas não se sacrificar. O povo não deve se deixar arrasar nem tranqüilizar, mas tampouco pode humilhar-se.
Trabalhadores de minha Pátria, tenho fé no Chile e seu destino. Superarão outros homens este momento cinzento e amargo em que a traição pretende impor-se. Saibam que, antes do que se pensa, de novo se abrirão as grandes alamedas por onde passará o homem livre, para construir uma sociedade melhor.Viva o Chile! Viva o povo! Viva os trabalhadores! Estas são minhas últimas palavras e tenho a certeza de que meu sacrifício não será em vão. Tenho a certeza de que, pelo menos, será uma lição moral que castigará a perfídia, a covardia e a traição."
Para ouvir o áudio do discurso, clique aqui.

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