sexta-feira, 22 de agosto de 2008

O Macarthismo italiano. O "Berlusconismo".

Matéria extraída do site Terra Magazine, revela uma fantástica história, que revive os trágicos atos da "caça às bruxas", promovida nos EUA.


A mãe do comunista

Vera Gonçalves de Araújo
De Roma

A situação é de uma banalidade indiscutível: um casal divorcia, e briga pela guarda dos filhos. Tudo recheado por outro lugar-comum que todos os que já lidaram com filhos adolescentes conhecem muito bem: tolerância ou linha dura com o garoto? O pai de Marco (o nome é inventado, pois o garoto é menor de idade) considera a mãe fraca demais diante dos excessos do filho. Pede ao tribunal a guarda dos dois filhos menores - de 16 e 11 anos - enquanto a mais velha, 18 anos, optou pela convivência com a mãe.

A notícia fica menos corriqueira quando se descobre que o tribunal decidiu entregar a guarda dos filhos ao pai - coisa rara na Itália. Entre os motivos, o fato que Marco é comunista de carteirinha. Militante, desde os 14 anos, no partido de Refundação comunista.

O juiz que decretou a sentença em Catania, a segunda cidade mais importante da Sicília, afirma que o comunismo do garoto não influenciou sua decisão. Que se baseou num relatório dos assistentes sociais que pintaram um quadro bastante negativo das relações entre a mãe e seu filho adolescente. E que descreve Marco como um garoto que falta às aulas, ficou de segunda época em latim, grego e filosofia, sai todas as noites com os amigos, freqüenta "lugares em que são servidas bebidas alcoólicas e entorpecentes" ( = bares), "várias vezes passou a noite fora de casa, com a autorização materna". Enfim, Marco é o retrato falado de 90 por cento dos adolescentes italianos. Com um detalhe a mais: é comunista.

Até os ministros do governo de Silvio Berlusconi - o campeão do anti-comunismo - acham que o juiz foi um pouquinho exagerado. Mesmo porque o relatório dos assistentes sociais parece escrito nos anos 50 italianos, quando as mulheres que não eram "do lar" eram consideradas mães relapsas. A mãe de Marco é médica, perdeu a guarda dos filhos e ainda tem que pagar 200 euros por mês ao ex-marido, que ganha menos do que ela e é funcionário público. O pai fez uma xerox da carteirinha do partido comunista que encontrou no bolso do filho, como prova de juventude transviada.

Marco - dizem os colegas que o entrevistaram que ele é um rapaz bonito, simpático, desembaraçado, inteligente, que demonstra mais de seus 16 anos - declarou que não pretende ir morar com o pai, com quem briga todos os dias por vários motivos. Ele corre o risco de ser internado numa comunidade de reabilitação, apesar de ter apresentado uma certidão médica que prova que ele não se droga. Os advogados do pai afirmam que a certidão é falsa, e portanto o juiz pode decidir mandar Marco para uma comunidade, para se desintoxicar. Não está claro se o tóxico é a maconha ou o comunismo.


Nota do blogueiro:

O magnata dos meios de comunicação de massa e da corrupção italiana, Sílvio Berlusconi, parece ter contagiado com seu anti-comunismo, à todas as esferas do poder público do país. Condenar uma mãe por ser a genitora de um militante a perder a guarda do filho, por causa de sua "doença" é um ato que nem mesmo o senador Macarthy, em seus pensamentos mais doentios talvez fosse capaz de conceber.

Considerar uma opção política o equivalente à dependência química é um ato de uma nação tirânica, totalitária, onde o direito ao livre pensamento foi cercado pelo devaneio do ditador de plantão.

Imaginem se a moda pega.

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